Decisão recente do STF pode ampliar a condição de imunidade de ITBI sobre os imóveis integralizados ao capital social
(18/08/2020)
Prezados clientes e colaboradores:
Uma decisão recente do STF (ainda pendente de publicação) pode trazer uma nova interpretação – e benéfica – às operações envolvendo reestruturação patrimonial e sucessória, mais especificamente em relação à não incidência do ITBI na integralização do capital social com imóveis próprios, apesar de toda a discussão ter se originado de um questionamento sobre o limite desse benefício constitucional por parte das autoridades fazendárias.
O tema é um pouco complexo, mas tentaremos simplificar ao máximo a dinâmica em torno da apuração do ITBI nesse tipo de planejamento.
Não é de hoje a discordância por parte de várias secretarias de finanças municipais sobre as condições da imunidade do ITBI quando da integralização de imóveis em capital societário. A referida decisão do STF sobre uma das “teses” levantadas pela fiscalização traz novos holofotes sobre os projetos de reorganização patrimonial e sucessória.
Inicialmente apontado por alguns veículos de imprensa como sendo prejudicial aos contribuintes, no nosso sentir, referida decisão traz, em tese, uma interpretação constitucional deveras “curiosa”, que pode ser refletida na forma de oportunidade.
O tema da ação discutida no STF gira em torno da constitucionalidade da imunidade tributária do ITBI – de competência municipal – quando da transferência de um imóvel para uma pessoa jurídica na forma de i) integralização de capital social subscrito ou ii) em decorrência de cisão, incorporação, fusão ou extinção.
Outra condição importante imposta pelo legislador constituinte é de que a empresa receptora do imóvel não tenha como foco preponderante o exercício de atividades imobiliárias (por preponderância, foi eleito um fator objetivo com base no faturamento global, que se verifica caso mais de 50% das receitas decorra da venda e/ou locação de imóveis). Até recentemente, a interpretação costumeiramente adotada pelas autoridades, era de que referida condição deveria se verificar tanto nas operações envolvendo a i) integralização, como naquelas ii) decorrentes de cisão, incorporação, fusão ou extinção.
É sobre esse aspecto que vemos a oportunidade acima comentada.
Adentrando um pouco mais no tema, qualquer outra imposição, além das apontadas acima, seria consideradas ilegais. Mesmo assim, nos últimos anos, temos verificado inúmeras tentativas, por parte dos órgãos fiscalizadores dos Municípios em barrar os pedidos de imunidade apresentados por seus contribuintes, com argumentos dos mais variados, como por exemplo:
i) de que a empresa receptora dos bens imóveis não poderia ter em seu objeto social a previsão de qualquer modalidade de atividade imobiliária (o que não possui base legal, uma vez que a Constituição afasta a imunidade tão somente se as receitas decorrentes dessas atividades superarem 50% das receitas totais);
ii) de que os imóveis integralizados não condizem com aqueles da atividade empresarial, como os imóveis de veraneio;
iii) criação de bases de cálculo subjetivas através da estipulação arbitrária de um valor de mercado dos bens imóveis;
iv) contestação do critério de receita para empresas que não apresentaram qualquer movimentação financeira por vários anos seguidos; dentre outros.
No caso em questão, julgado pelo STF, um contribuinte supostamente (pois ainda não foi disponibilizada a integra do acórdão) subscreveu o capital de uma empresa por R$ 24 mil, que foi integralizado mediante a concessão de bens imóveis. Entretanto, os imóveis estavam registrados (acreditamos que na DIRPF) por R$ 800 mil. Dessa forma, o contribuinte considerou os R$ 24 mil como efetivamente integralizados, e o valor remanescente de mais de R$ 770 mil registrado em conta de reserva. Esse procedimento despertou a atenção da fiscalização, que concedeu a imunidade do ITBI tão somente ao montante relativo à porção efetivamente integralizada na forma de capital social, e cobrando a diferença do tributo sobre os R$ 770 mil excedentes.
Abrindo um parênteses, pode parecer insensata tal movimentação (uma vez que o contribuinte poderia ter aumentado o saldo do capital social para se adequar ao valor total dos imóveis), porém, em alguns casos, há uma estratégia em tentar evitar uma futura incidência de ITCMD – esse, de competência estadual – quando da doação das quotas da empresa para os herdeiros.
Finalmente, e pelo o que tivemos informação, o STF validou o entendimento da fiscalização, arguindo que, de fato, a imunidade do ITBI prevista na Constituição estaria atrelada ao valor dos imóveis integralizados na forma de capital social (vale notar que a conta de capital social é apenas uma, dentre as demais que compõe o patrimônio líquido de uma sociedade). Já para os casos de transferências de bens imóveis decorrentes de incorporação, cisão, fusão ou extinção, não se verificaria tal correlação.
Como a transferência dos imóveis para fins de integralização ultrapassou o valor do capital social (qual limitador da isenção fiscal), eventual diferença deveria ser oferecida à tributação. Uma vez que a decisão do STF se valeu de repercussão geral, tal entendimento se estenderá para todos os demais casos semelhantes (atuais e ou futuros) – o que poderá trazer preocupação aos demais contribuintes que, dentro de seus projetos organizacionais, adotaram critérios semelhantes.
Um primeiro ponto importante que extraímos desse novo cenário criado pelo STF é de que, os contribuintes que adotaram procedimentos semelhantes, realmente podem se encontrar em situação de exposição, e uma reanálise de seus planejamentos se faz necessária – especialmente para evitar o processo fiscalizatório e a imposição das penalidades dele oriundas (podendo chegar a até 150%).
Agora, um segundo ponto importante que extraímos da decisão – e que parece ter passado despercebido por várias das fontes que divulgaram a matéria (e que, como comentamos, precisará ser confirmada posteriormente com a publicação oficial do acórdão) – diz respeito à condição de preponderância para a atividade imobiliária.
Em seu voto, o ministro Alexandre de Moraes deixa claro que tal condição somente se aplica às transferências de imóveis decorrentes de cisão, incorporação, fusão ou extinção; e não àquelas decorrentes de integralização de capital social.
Em outro dizer, o STF declarou que, de forma interpretativa, nas operações envolvendo a integralização do capital social com bens imóveis (obviamente, que observada a correlação ao saldo da conta, nos termos julgados), o contribuinte sempre se beneficiará da imunidade do ITBI, independentemente da atividade exercida, imobiliária ou não, preponderante ou não.
Como comentamos, visualizamos aí uma nova tese de discussão para os contribuintes interessados em novas estruturas organizacionais, ou até mesmo aqueles que realizaram operações envolvendo integralizações de capital social com imóveis nos últimos 5 anos e foram compelidos a pagar o ITBI por parte da fiscalização.
Nossa equipe, como sempre, está à disposição para auxiliar nas repercussões desse tema.
Gustavo Silva
Bruno Accioly